[.: Jornalismo e Algo Mais :.] O trabalhismo, Vargas e a CLT

Este artigo não pretende discutir a gestão de Getúlio Vargas, por quase duas décadas, como presidente do Brasil. Ele, assim como seus antecessores e sucessores, teve erros e acertos políticos e pessoais, que fazem parte da história. O que compete a nós, neste trabalho, é discutir a inegável contribuição de Vargas para o trabalhador brasileiro e sua principal criação – a Consolidação das Leis do Trabalho, em vigência até hoje. Claro que, os detratores do político gaúcho que saudava o povo com o famoso bordão "Trabalhadores do Brasil", afirmam que a CLT foi um jogo que Vargas usou para se manter no poder. A afirmação é verdadeira, em parte. Mas é necessário ressaltar que, depois de Vargas, pouco se fez pelo trabalhador brasileiro, que ainda vê muitos de seus direitos consolidados há seis décadas serem desrespeitados todos os dias.

1 Histórico

Getúlio Vargas ascendeu ao poder por meio de um golpe de estado. A Revolução de 1930, comandada por Vargas, então presidente do estado do Rio Grande do Sul (à época não se usava o termo governador) veio romper com a chamada Política Café com Leite, onde paulistas e mineiros revezavam-se na Presidência da República. Os paulistas erraram ao querer permanecer no poder por mais quatro anos. Minas Gerais se uniu ao Rio Grande do Sul e Vargas tomou o Palácio do Catete, sede do Governo quando o Rio de Janeiro ainda era a Capital do país. Vargas presidente pôs fim à República Velha, período da história brasileira entre a Proclamação da República, em 1889 e 1930. Lá ficou por 15 anos por meio de uma ditadura com raios de democracia. Deposto em 1945, ele seria, cinco anos mais tarde, eleito pelo voto popular e suicidou-se, enquanto presidente, em 1954.

Entendemos que a forma da chegada de Vargas ao poder não é das mais democráticas, mesmo rompendo com uma oligarquia dominante. Entretanto, qualquer afirmação de que Vargas se uniu aos trabalhadores com o mero intuito de manutenção do status quo é falaciosa. O novo presidente necessitava imprimir a marca de seu governo. Ao eleger o trabalhismo, Vargas e seu trabalho tornaram-se indeléveis na história do Brasil.

É importante destacar que o ano de 1930 é complicado em todo o mundo, principalmente pelo crack da Bolsa de Nova Iorque ocorrida no ano anterior. É esta a base do texto "O Passado do Trabalho" de autoria de Max Gehringer e que norteia este artigo.

Gehringer relata que "as transformações [do mercado de trabalho] foram tantas que 1930 dá a impressão de estar mais próximo do dia em que Pero Vaz de Caminha rabiscou a primeira carta em solo tupiniquim que da era da internet". Este marco, por ele apontado, está relacionado estritamente com o governo trabalhista de Getúlio Vargas.

2 O trabalhismo

O nome Trabalhismo antecede nosso período de estudo. É a denominação dada ao movimento do operariado para defesa dos seus interesses políticos e econômicos, sem ligação direta com os princípios socialistas. Originalmente, teve início na Inglaterra do século XIX, paralelamente à ideologia socialista com as lutas dos sindicatos por direitos.

O surgimento da legislação trabalhista e da Justiça do Trabalho no Brasil veio como conseqüência deste longo processo de luta e de reivindicações operárias desenvolvida no mundo, e sofreu influência dos princípios de proteção ao trabalhador, defendidos pelo Papa Leão XIII em sua encíclica Rerum Novarum, de 1891. As primeiras normas de proteção ao trabalhador datam da última década do século XIX, como é o caso do Decreto nº 1.313, de 1891, que regulamentou o trabalho dos menores de 12 a 18 anos. Em 1907, foi instituída uma lei que tratou da sindicalização rural. Em 1917, foi criado o Departamento Nacional do Trabalho (DNT) como órgão fiscalizador e informativo.

A denominação Justiça do Trabalho surgiu na Constituição de 1934, já na era Vargas. Embora, à época, alguns doutrinadores consideravam que esta estrutura integrava o Judiciário nacional, como parte integrante do Poder Judiciário, legalmente ainda era mantida no âmbito administrativo. Apesar de a Justiça do Trabalho ter previsão na Constituição de 1934, não foi instalada. O Congresso Nacional discutiu longamente o projeto de lei que a estruturava. A demorada discussão sobre a representação classista foi uma das razões alegadas para o fechamento do Congresso Nacional e a implantação do Estado Novo em 1937, quando Getúlio Vargas permaneceu no poder, desta vez, numa ditadura institucional.

A Constituição de 1937, 10 de novembro de 1937, que substituiu a de 1934, manteve a Justiça do Trabalho na esfera administrativa. A sua criação se deu no dia 1º de maio de 1939, pelo Decreto-lei nº 1.237.

A CLT surgiu como uma necessidade institucional após a criação da Justiça do Trabalho em 1939. Em janeiro de 1942 o presidente Getúlio Vargas e o ministro do trabalho Alexandre Marcondes Filho reuniram-se para discutir sobre a necessidade de fazer uma consolidação das leis do trabalho. A idéia primária foi de criar a "Consolidação das Leis do Trabalho e da Previdência Social". Participaram dos trabalhos os juristas Segadas Viana, Oscar Saraiva, Luís Augusto Rego Monteiro, Dorval Lacerda Marcondes e Arnaldo Lopes Süssekind.

Na primeira reunião definiu-se que, em que pese a proximidade dos temas, Trabalho e Previdência seriam divididos e que seriam criadas duas consolidações diferentes. As fontes materiais da CLT foram, em primeiro lugar, as conclusões do 1° Congresso Brasileiro de Direito Social, realizado em maio de 1941, em São Paulo, para festejar o cinqüentenário da Encíclica Rerum Novarum, organizado pelo professor Cesarino Júnior e pelo advogado Rui Azevedo Sodré. A segunda fonte foram as convenções internacionais do trabalho. A terceira foi a própria Encíclica Rerum Novarum e, finalmente, os pareceres dos consultores jurídicos Oliveira Viana e Oscar Saraiva, aprovados pelo ministro do Trabalho.

Em novembro de 1942, foi apresentado o anteprojeto da CLT, publicado posteriormente no Diário Oficial para receber sugestões. Após estudar o projeto, Getúlio Vargas deu aos co-autores e nomeando os mesmos para examinar as sugestões e redigir o projeto final, finalmente foi assinado em 1º de maio de 1943.

A assinatura da CLT foi uma festa, populista como era o estilo Vargas. Num estádio lotado, para a comemoração do Dia do Trabalho, a sanção que unificou toda legislação trabalhista então existente no Brasil, foi assinada em São Januário (propriedade do Club de Regatas Vasco da Gama), que era o maior estádio no Rio de Janeiro à época. O Maracanã seria inaugurado sete anos mais tarde para a 4ª edição da Copa do Mundo.

Segundo Júlio César Zanluca, em sua obra "CLT – Atualizada e Anotada", a Consolidação tem como principal objetivo, regulamentar as relações individuais e coletivas do trabalho, tanto na área urbana como na rural. Desde sua publicação já sofreu várias alterações, visando adaptar o texto à modernidade. Apesar disso, ela continua sendo o principal instrumento para regulamentar as relações de trabalho e proteger os trabalhadores.

Seus principais assuntos são:

o Registro do Trabalhador/Carteira de Trabalho
o Jornada de Trabalho
o Período de Descanso
o Férias
o Medicina do Trabalho
o Categorias Especiais de Trabalhadores
o Proteção do Trabalho da Mulher
o Contratos Individuais de Trabalho
o Organização Sindical
o Convenções Coletivas
o Fiscalização
o Justiça do Trabalho e Processo Trabalhista

Essas mudanças na característica do trabalho são, por sinal, destacadas por Gheringer. "Durante esses 15 anos [do primeiro período Vargas], foram sedimentados os direitos básicos dos trabalhadores. Como o registro em carteira, o direito às férias e à aposentadoria e o salário mínimo.

Aos poucos, a população foi migrando do campo para as cidades. A industrialização fez com que, em 1958, São Paulo se tornasse a maior cidade do Brasil, com 3,3 milhões de habitantes. Dos 65 milhões de brasileiros de 1958, 53% tinham menos de 20 anos. Esse enorme contingente de jovens já não pensava como a geração de 1930. Sua meta passara a ser a indústria, e não mais a roça".

Em quase oito décadas, não há como se negar que o emprego mudou, assim como todo o resto. Outro dia, pouco mais de duas décadas atrás, qualquer pessoa que hoje esteja na faixa dos 40 anos tinha na datilografia exímia, o diferencial exigido para o mercado. Ainda nos meados dos anos 80, as primeiras e básicas noções de informática, principalmente a digitação, eram o valor que se deveria agregar aos jovens de então. Falar um segundo idioma, mormente o inglês, era garantia de sucesso e empregabilidade certa.

A concorrência, focada na carência de oferta de empregos e na recessão que existiu na mesma década de 80, fez com que o mercado exigisse cada vez mais dos profissionais. Gheringer relata que "em apenas 30 anos, o pré-requisito acadêmico para uma boa vaga saltou de 3 mil horas de estudo para 11 mil horas. Sem que o salário inicial aumentasse na mesma proporção. Ao contrário".

A Consolidação das Leis Trabalhistas não acompanhou toda essa mudança. Óbvio que suas bases de justiça social – registro em carteira, jornada de trabalho, férias, entre outros – lá permanecem e assim devem perdurar. Mas o trabalhador nem sempre pode usufruir deste direito. Excesso de carga tributária no Brasil, concorrência em demasia num mercado que só é Coeteris paribus para nossos estudos, ainda é traduzido por 2 milhões de desempregados e outros tantos milhares no chamado trabalho informal.

Apesar das críticas sofridas ao longo do tempo, a CLT tem cumprido seu papel, especialmente na proteção dos direitos do trabalhador. Necessita, porém de uma urgente atualização. Seus aspectos burocráticos e excessivamente regulamentadores é um entrave, principalmente em relação, às pequenas e médias empresas.

Referências

BRASIL. Constituição (1934). Constituição da República dos Estados Unidos do Brasil. Disponível em: < http://www.planalto.gov.br/ccivil_03/Constituicao/Constituiçao34.htm>. Acesso em 08 nov. 2008.

BRASIL. Constituição (1937). Constituição dos Estados Unidos do Brasil. Disponível em: Constituiçao37.htm>. Acesso em 08 nov. 2008.

BRASIL. Decreto-lei nº 5.452, de 1 de maio de 1943. Aprova a consolidação das leis do trabalho. Disponível em: . Acesso em 08 nov. 2008.

GEHRINGER, Max. O Passado do Trabalho. Revista Época. Disponível em: . Acesso em: 08 nov. 2008.

LEÃO XIII, Papa. Carta Encíclica "Rerum Novarum" sobre a condição dos operários de 15 de maio de 1891. Vaticano. Disponível em: vatican.va/holy_father/leo_xiii/encyclicals/documents/hf_l-xiii_enc_15051891_rerum-novarum_po.html>. Acesso em 08 nov. 2008.

VIANA, Diego. Conheça a história da CLT, que modernizou a legislação em 43. Folha Online. Disponível em: ult91u36226.shtml>. Acesso em 08 nov. 2008.

ZANLUCA, Júlio César. A Consolidação das Leis do Trabalho – CLT. Disponível em: . Acesso em 08 nov. 2008.

Ivan L. Jacob, Luciana Ueda e Sylvio Micelli
(*) Trabalho de alunos de Economia da Unicsul – novembro/2008


Sylvio Micelli

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Uma resposta para [.: Jornalismo e Algo Mais :.] O trabalhismo, Vargas e a CLT

  1. ozanna disse:

    esse trabalho e de mais, pra lá de bom

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